Propagação de fogos florestais

Imagem de satélite de um fogo florestal em Portugal.

O modelo de percolação de sítios, descrito na página anterior, pode ser aplicado a uma variedade de sistemas e processos. Aqui vamos descrever a sua aplicação ao estudo da propagação dos fogos florestais.

O estudo da evolução de fogos florestais é difícil porque os métodos das ciências experimentais não podem ser utilizados. Contudo o problema pode ser formulado na linguagem da percolação, onde a floresta é representada por uma rede quadrada com N sítios. O efeito da desordem é modelado através da ocupação aleatória de uma fracção dos sítios da rede. Os sítios estão ocupados por uma árvore (verde), com probabilidade p, 0 p 1, que representa a densidade de florestação. Em média, pN sítios estão ocupados e (1 - p)N sítios estão desocupados (preto).

A propagação do fogo é simulada de acordo com as regras seguintes. Incendeia-se uma fila de árvores (vermelho) na orla esquerda da floresta. Uma árvore começa a arder se alguma das vizinhas estiver a arder nesse instante. Uma árvore arde durante uma unidade de tempo e uma árvore queimada é equivalente a um sítio sem árvores (preto). O fogo não pode saltar sobre sítios sem árvores e esses sítios não podem arder nem incendiar outros, bloqueando a propagação do fogo. A simulação termina quando o fogo chegar à outra orla da floresta ou quando já não houver árvores a arder. A média sobre várias simulações permite calcular a percentagem de árvores queimadas e a duração do fogo, para cada valor de p.

Simulação de um fogo florestal.

Os resultados mostram que existe um valor de p para o qual a duração do fogo aumenta bruscamente. Porquê? Para p perto de 1, cada fila incendeia a fila seguinte e o fogo rapidamente atinge o lado oposto da floresta num único passo. Para p perto de 0, a maior parte das árvores a arder não têm vizinhas e o fogo extingue-se rapidamente. Existe um valor crítico de p, p = pc, para o qual um percurso através de árvores vizinhas liga pela primeira vez as duas orlas da floresta, isto é, aparece um agregado de percolação. É este valor de p que separa o regime de extinção do regime de fogos catastróficos. No limiar de percolação a duração do fogo diverge, na floresta 'infinita', como consequência da natureza fractal do agregado de percolação a que fizemos referência na página anterior. Esta divergência é análoga à que ocorreria se tentássemos percorrer uma linha de costa seguindo todas as suas rugosidades: contornar cada cabo, em cada cabo contornar cada saliência, em cada saliência contornar cada rocha e em cada rocha contornar cada pedra... No limite demoraríamos um tempo infinito, como consequência da dimensão fractal desta 'linha'.

O efeito do vento pode ser incluído no modelo, considerando que uma árvore a arder propaga o fogo não apenas às árvores vizinhas, mas também a árvores a uma distância proporcional à intensidade do vento, na direcção deste. O novo modelo permite realizar experiências (sem queimar árvores) para prever a propagação do fogo a uma determinada região, em função da direcção e intensidade do vento. Permite ainda calcular uma densidade segura de árvores para evitar fogos catastróficos e estimar a sensibilidade desta densidade às características do vento. Modelos mais realistas podem incluir outros factores: variação do tempo de combustão das árvores, humidade, mudanças de vento, irregularidades no terreno e densidade de mato. Alguns destes efeitos podem ser simulados modificando as regras de propagação do modelo anterior.

Fogo florestal.Combate às chamas.

Verifique os resultados descritos nesta página usando o applet que pode encontrar aqui, feito na linguagem NetLogo.